domingo, 24 de junho de 2007

Domingo 24, - Programa "Estética do Subdesenvolvimento"


Domingo, 24 – Programa "Estética do Subdesenvolvimento"

15h

Couro de Gato. De Joaquim Pedro de Andrade. (Brasil, 1961, 12 min).

Argumento/roteiro/direção: Joaquim Pedro de Andrade Assistência de direção: Domingos de Oliveira Direção de fotografia: Mário Carneiro Assistência de fotografia: David Neves Montagem: Jacqueline Aubrey Música: Carlos Lira Versos Geraldo Vandré Produção: Saga Filmes Produtor: Marcos Farias, Nélson Lins e Barros Orquestração: Carlos Monteiro de Souza Locação: Favela Cantagalo, Favela Pavão Elenco: Francisco de Assis, Riva Nimitz, Henrique César, Napoleão Muniz Freire, Cláudio Correia e Castro, Milton Gonçalves, Domingos de Oliveira, Paulinho, Sebastião, Aylton e Damião.

Às vésperas do carnaval, garotos de uma favela roubam gatos para fabricantes de tamborins. Exercício de realismo lírico, síntese de ficção e documentário, o filme narra o amor de um menino por um angorá e seu dilema ao ter que vender o bichano.


O Leão de sete cabeças. De Glauber Rocha (Congo/França/Itália, 1971, 103min).

Argumentistas e roteiristas: Gianni Amico, Glauber Rocha Diretor de fotografia: Guido Cosulich Produtores: Gianni Barcelloni, Claude Antoine Diretor de produção: Giancarlo Santi Gerente de produção: Marco Ferreri Som direto: José Antônio Ventura Montadores: Eduardo Escorel, Glauber Rocha Letreiros: Francesco Altan Música: Folclore africano, Baden Powell e uma versão do hino nacional francês cantada por Clementina de Jesus Locações: Congo Brazzaville. Elenco: Rada Rassimov, Jean-Pierre Léaud, Giulio Brogi, Hugo Carvana, Gabrielle Tinti, René Koldhoffer, Baiack, Miguel Samba, André Segolo, Aldo Bixio, povo e dancarinos do Congo. Dedicatória: a Paulo Emilio Salles Gomes.

“É uma história geral do colonialismo euro-americano na África, uma epopéia africana, preocupada em pensar do ponto de vista do homem do Terceiro Mundo, por oposição aos filmes comerciais que tratam de safaris, ao tipo de concepção dos brancos em relação àquele continente. É uma teoria sobre a possibilidade de um cinema político. Escolhi a África porque me parece um continente com problemas semelhantes aos do Brasil” (GR).


17h

O Pais de São Saruê . De Vladimir Carvalho (Brasil, 1971, 90 min)

Argumento: Vladimir Carvalho Autoria: Manuel Camilo dos Santos Roteirista: Vladimir Carvalho Estória: Baseada no poema Viagem a São Saruê, de Manuel Camilo dos Santos Direção de fotografia: Manuel Clemente Câmera: Manuel Clemente Montagem: Eduardo Leone Companhia(s) produtora(s): João Ramiro Mello Produções Cinematográficas Produção: Vladimir Carvalho e João Ramiro Mello Música (Genérico): Ernesto Nazareth, José Siqueira, Luiz Gonzaga e Marcus Vinicius Locação: Fazenda Acauã - oeste da Paraíba; PE; RN; CE Elenco: Jose Gadêlha, Charles Foster, Alma Peace Corps, Pedro Alma, Zeca Inocêncio, Antônio Mariz Narração Paulo Pontes.

Com a extinção da nação Cariri pelos colonizadores, os índios perderam suas terras nos sertões do Nordeste, há quase três séculos. No início dos anos 70, registra-se uma espécie de renascimento com a exploração de novos minérios. A antiga cultura pastoril, a rusticidade dos costumes, os campos lavrados sol a sol, a folgaça do Bumba-Meu-Boi definham e convivem melancolicamente com outras formas de vida trazidas pelo rádio, cinema e televisão.


18h30min

Debate com o diretor Vladimir Carvalho






20hs

30min Cabra Marcado para Morrer. De Eduardo Coutinho (Brasil,1964-1984, 119min)

Argumento e roteiro: Eduardo Coutinho Direção de fotografia e câmera: Fernando Duarte e Edgar Moura Companhia(s) produtora(s): CPC - Centro Popular de Cultura da UNE - União Nacional dos Estudantes; MPC - Movimento de Cultura Popular de Pernambuco Mapa de Produção: Zelito Viana, Eduardo Coutinho Direção de produção: Marcos Maria e Alberto Graça Produção executiva: Leon Hirszman e Zelito Viana Produtor associado: Vladimir Carvalho Companhia(s) distribuidora(s): Gaumont do Brasil Som direto: Jorge Saldanha
Efeitos especiais de som: Geraldo José e Antônio César Montagem: Eduardo Escorel Música Rogério Rossini Locação: Engenho Galiléia - PE; Pernambuco; Paraíba; Rio Grande do Norte; Rio de Janeiro; São Paulo; Santa Clara – CU Locução Tite de Lemos e Eduardo Coutinho Narração Ferreira Gullar


No início da década de sessenta, um líder camponês, João Pedro Teixeira, é assassinado por ordem dos latifundiários do Nordeste. As filmagens de sua vida, interpretada pelos próprios camponeses, foram interrompidas pelo golpe militar de 1964. Dezessete anos depois, o diretor retoma o projeto e procura a viúva Elizabeth Teixeira e seus dez filhos, dispersados pela onda de repressão que seguiu ao episódio do assassinato. O tema principal do filme passa a ser a trajetória de cada um dos personagens que, por meio de lembranças e imagens do passado, evocam o drama de uma família de camponeses durante os longos anos do regime militar.


sábado, 23 de junho de 2007

Sábado, 23 - Programa "A Argentina hoje"


Sábado, 23 – Programa "A Argentina hoje"

15hs

Sur De Fernando Solanas (Argentina/França, 1988, 127min). Em espanhol sem legendas.

Assistente de direção: Gaspar Noé Direção de fotografia: Félix Monti Montagem: Juan Carlos Macias e Pablo Mari Produção executiva: Sabina Sigler Direção de produção: Dolly Pussi Produção: Envar El Kadri, Fernado Solanas, Pierre Novat Música: Ástor Piazzolla, Fernando Solanas, Fito Páez e Aníbal Troilo Som direto: Aníbal Libenson e Daniel Fainzilber Elenco: Miguel Ángel Solá, Susú Pecoraro, Philippe Leotard, Lito Cruz e grande elenco.


Floreal, um preso político que passou seus últimos cinco anos encarcerado, é solto e deve retornar para casa, onde sua mulher, Rosi, o espera. O trajeto, no entanto, não é tão simples como parece. Ao longo desses cinco anos muita coisa mudou, e Floreal precisa ajustar as contas com todo esse universo, factual e imaginário. Ao invés de dirigir-se imediatamente ao lar, o protagonista acaba caminhando durante a noite por ruas cheias de ausências. Durante o percurso, encontrará com seus rancores e incertezas, e mesmo com uma companhia sobrenatural. Enquanto isso, a esposa, também tomada por nervosismos, medos e incertezas, o espera.


17hs30min

Memoria del saqueo. De Fernando Solanas. (Suíça/Franca/Argentina, 2004, 120min) Com legendas em espanhol.

Assistente de direção: Iván Gotthold Direção de fotografia: Alejandro Fernández Mouján e Fernando Solanas Montagem: Juan Carlos Macias e Fernando Solanas Produtor associado: María Marta Solanas Direção de produção: Daniel Samyn Música: Gerardo Gandini Som direto: Abelardo Kuschnir, Marcos Dickinson e Eric Vaucher Elenco: Fernando Solanas.

A saída do governo do presidente argentino Fernando de La Rúa é o ponto de partida deste documentário que analisa os mecanismos que levaram a Argentina a mergulhar em uma crise sem precedentes na sua história.


19h Debate com o diretor Fernando Solanas e o crítico Jose Carlos Avellar.

sexta-feira, 22 de junho de 2007

Sexta-Feira, 22 – Programa "El Sur – O mito do povo"

18hs La Tierra Quema. De Raymundo Gleyzer (Argentina, 1964, 12min). Em espanhol sem legendas.

Los Inundados. De Fernando Birri (Argentina, 1961, 87min). Em espanhol sem legendas.

20hs

La hora de los Hornos . De Fernando Solanas, Octavio Getino e Grupo Cine Liberación Argentina (Argentina, 1967/1968 , 260 min.) Em espanhol sem legendas.

La Tierra quema De Raymundo Gleyzer (Argentina, 1964, 12min)

Texto: Víctor Pronzato (Proncet). Fotografia: Rucker Vieira. Som: Estudios Antártida Locutor: Rudy Carrie Laboratórios: Tecnofilm Produtor: Rodolfo Goldschwartz.

Realizado no sertão brasileiro, mostra a miséria e a fome de uma família camponesa. Como diz o dirigente Francisco Julião “que o mundo inteiro veja o nordeste brasileiro, é o seu espelho”.

Los Inundados De Fernando Birri (Argentina, 1961, 87min)
A partir do conto homônimo de Mateo Booz. Produção executiva: Edgardo Pallero e David Zwilich Direção de produção: Carlos A. Parrilla Assistente de direção: Bernardo Arias Direção de fotografia: Adelqui Camusso Câmera: Alberto Curchi Montagem: Antonio Ripoll Música: Ariel Ramírez Som direto: Jorge Castronuovo Elenco: Pirucho Gómez, Lola Palomba, María Vera, Roberto Pérez.

A luta da população de Santa Fé, Argentina, pelo ressarcimento econômico e pelo castigo dos responsáveis políticos de uma trágica inundação que já era esperada.

La Hora de los hornos: Notas y testimonios sobre el neocolonialismo, la violencia y la liberación. De Fernando Solanas, Octavio Getino e Grupo Cine Liberación Argentina (Argentina, 1967/1968 , 90 min.)
Roteiro: Fernando Solanas, Octavio Getino. Direção de produção: Edgardo Pallero assistente de direção: Gerardo Vallejo Direção de fotografia: Juan Carlos Desanzo Câmera: Fernando Solanas Montagem: Antonio Ripoll, Fernando Solanas e Juan Carlos Macias Música: Roberto Lar e Fenando Solanas Som direto: Octavio Getino e Aníbal Libenson Finalização: Fernando Solanas Elenco: Edgardo Suárez, María de la Paz, Fernando Solanas.

Clássico do cinema latino-americano, a trilogia La hora de los hornos, produzida e difundida clandestinamente na época, relata a história e condição política da Argentina, buscando encerrar fileiras na luta pela libertação do povo argentino. Esta primeira parte, constituída de um prólogo e treze notas, desvela a real situação da nação argentina e da América Latina: dependência. Dedicada a Che Guevara e a todos os patriotas que caíram na luta pela libertação indo-americana.

quinta-feira, 21 de junho de 2007

Quinta-Feira, 21 – Programa "Visões da América Latina"

18hs

Org de Fernando Birri (Argentina, 1967-1978,104min) Em espanhol sem legendas.

20hs30min

El Chacal de Nahueltoro. De Miguel Littin (Chile/México, 1969, 86min). Legendas em espanhol.


Org De Fernando Birri (Itália/Argentina, 1978, 104min)

Direção, argumento e roteiro: Fernando Birri ( com o pseudônimo de Fermaghorg) Fotografia: Mario Masini, Ugo Piccone, Mario Vulpiani, Houston Simmons, Cesare Ferzi Efeitos especiais: Cesare Ferzi, Carmen Papio Birri, Carlo Ventimiglia Som: Sergio Pagoni, Fernando Birri Musica: Enrico Rava Cenografia: Nato Frascà, Dafne Ciriachi, Giacomo Calò Carducci, Sandro La Ferla. Montagem: Paolo Zarnattio, Settimio Presutto, Fernando Birri. Produção executiva: Carmen Papio Birri, Settimio Presutto, Fernando Birri. Elenco: Terence Hill, Lidija Juracik , Isaac Tweg Obn, Nolika Pareda , Pietro Santalamazza "Sawytri" , Francesco "Big" Di Giácomo.

Segundo o diretor, “Org es una palabra inventada, pero al mismo tempo es la raíz de tantas palabras cuantas tu puedas hacer derivar de esta raíz y cualquier palabra que tu hagas derivar de esta raíz me funciona bien como titulo de esta película, que por otra parte yo hago llamar de no-película. Le hago llamar de no-film , porque en definitiva Org es una fabrica ideológica, es un film poema, no un film de poesía en el sentido en que Pasolini llamaba a sus films, que eran magistrales, pero no en ese sentido de cine de poesía, sino film poema, que es un concepto diverso porque es el cine que se asume a si mismo como poema, no hablar de poesía sino para hacer poesía“.

El Chacal de Nahueltoro De Miguel Littin (Chile/México, 1969, 95min)
Direção e roteiro: Miguel Littin Direção de fotografia: Héctor Ríos Música: Sergio Ortega
Elenco: Nelson Villagra, Shenda Román, Héctor Noguera, Marcelo Romo, Luis Alarcón.

Baseado em fatos reais, o filme recria um dos grandes crimes ocorridos no Chile na década de 60, quando um camponês chamado José del Carmen Valenzuela Torres foi preso pelo assassinato de uma camponesa e seus cinco filhos na localidade de Nahueltoro.


quarta-feira, 20 de junho de 2007

Quarta-Feira, 20 – Programa "A Batalha do Chile"

18hs A Batalha do Chile . De Patricio Guzmán. (Cuba/Chile/França/Venezuela). Legendas em português.

I A insurreição da burguesia (1975, 100min).

II O golpe militar (1977, 90min).

III O poder popular (1979, 82min).


A Batalha do Chile De Patricio Guzmán (La Batalla del Chile Cuba/Chile/França/Venezuela 1975, 1977, 1979, 100 min, 90 min, 82 min)

Direção, produção, roteiro: Patricio Guzmán. Diretor de fotografia e câmera: Jorge Müller Silva Montagem: Pedro Chaskel Som direto: Bernardo Menz.

A Batalha do Chile é o resultado de seis anos de trabalho do cineasta Patrício Guzmán. Dividido em três partes (A insurreição da burguesia, O golpe militar e O poder popular), o filme cobre um dos períodos mais turbulentos da história do Chile, a partir dos esforços do presidente Salvador Allende em implantar um regime socialista (valendo-se da estrutura democrática) até as brutais conseqüências do golpe de estado que, em 1974, instaurou a ditadura do general Augusto Pinochet.



Visite o site do diretor Patricio Guzmán: www.patricioguzman.com



terça-feira, 19 de junho de 2007

Terça-Feira, 19 – Programa "Revoluções e América Latina"



18hs
Maranhão 66
. De Glauber Rocha. (Brasil, 1966, 11min ).
Terra em transe De Glauber
Rocha (Brasil, 1967, 115min).


20hs
Coquetel de abertura


20hs30min

Assembléia Geral De Tomás Gutiérrez Alea (Cuba, 1960, 13min). Em espanhol, sem legendas.
Memorias do subdesenvolvimento De Tomás Gutiérrez Alea (Cuba, 1968, 104 min.). Legendas em português.


Maranhão 66 De Glauber Rocha. (Brasil, 1966, 11min)
Direção de fotografia e câmera:
Fernando Duarte Som Direto: Eduardo Escorel Montador: João Ramiro Melo Companhia Produtora: Mapa Filmes Produtores: Luiz Carlos Barreto e Zelito Viana Diretor de Produção: Zelito Viana.

José Sarney, eleito governador do Maranhão, faz discurso de posse. Aclamado em praça pública por milhares de pessoas, ele afirma: "O Maranhão não quer a violência, a miséria, a fome, a o analfabetismo, as taxas de mortalidade infantil". E acrescenta que o novo governo vai criar "o Maranhão da liberdade, do progresso, da grandeza e da felicidade". Sobre o discurso do candidato contrapõem-se imagens documentárias: habitações miseráveis, pessoas pobres, doentes sem atendimento e hospitais em péssimas condições. O filme termina com uma festa noturna em homenagem a Sarney.

Terra em transe De Glauber Rocha (Brasil, 1967, 106min)
Argumentista e roteirista: Glauber Rocha Diretor de fotografia: Luiz Carlos Barreto Câmera: Dib Lufti Montador: Eduardo Escorel Música original: Sérgio Ricardo Produtor executivo: Zelito Viana Produtores associados: Luiz Carlos Barreto, Carlos Diegues, Raymundo Wanderley, Glauber Rocha Assistentes de direção: Antônio Calmon, Moisés Kendler Elenco: Jardel Filho, Paulo Autran, José Lewgoy, Glauce Rocha, Paulo Gracindo, Hugo Carvana, Danuza Leão, Jofre Soares, Modesto de Sousa, Mário Lago, Flávio Migliaccio e grande elenco.

“Convulsão, choque de partidos, de tendências políticas, de interesses econômicos, violentas disputas pelo poder é o que ocorre em Eldorado, país ou ilha tropical. Situei o filme aí porque me interessava o problema geral do transe latino-americano e não somente do brasileiro. Queria abrir o tema "transe", ou seja, a instabilidade das consciências. É um momento de crise, é a consciência do barravento" (GR).

Visite o site do Templo Glauber: http://www.tempoglauber.com.br/



Assembléia geral De Tomás Gutiérrez Alea ( Asamblea general, Cuba, 1960, 13 min)
Direção / fotografia: Ramón F. Suárez, Néstor Almendros, Jorge Haydú, Luis Marzoa, Arturo Agramonte, Gustavo Maynulet Montagem: Angel López. Som direto: Departamento de Som da ICAIC.

Registro do discurso de Fidel Castro conhecido como Primeira Declaração de Havana, realizado a partir da ruptura dos países latino-americanos com Cuba.


Memórias do subdesenvolvimento. De Tomás Gutiérrez Alea (Memorias del subdesarollo, Cuba, 1968, 97 min.)
Direção em colaboração com Edmundo Desnoes Direção de Fotografia: Ramón F. Suárez Montagem: Nelson Rodríguez Música: Leo Brouwer Som direto: Eugenio Vesa, Germinal Hernández, Carlos Fernández Com Sergio Corrieri, Daysi Granados, Eslinda Núñez, Beatriz Ponchova, Gilda Hernández, René de la Cruz.

Sergio é um burguês que decide ficar em Cuba depois da revolução, enquanto toda sua família deixa o país. A trama se constitui na confrontação entre uma realidade efervescente que instala novos valores e Sergio que não crê neles e duvida dos valores do passado. A história se passa entre o início da Revolução Cubana e a ocupação dos Estado Unidos na Baía dos Porcos.


Visite a página oficial do diretor Tomás Gutiérrez Alea:
http://www.clubcultura.com/clubcine/clubcineastas/titon/index.htm


sábado, 16 de junho de 2007

Estética do Sonho - Manifesto de Glauber Rocha



EZTETYKA DO SONHO 71

(...)Este congresso em Colúmbia é uma oportunidade que tenho para desenvolver algumas idéias a respeito de arte e revolução. O tema da pobreza está ligado a isto.
As Ciências Sociais informam estatísticas e permitem interpretações sobre a pobreza.
As conclusões dos relatórios dos sistemas capitalistas encaram o homem pobre como um objeto que deve ser alimentado. E nos países socialistas observamos a permanente polêmica entre os profetas da revolução total e os burocratas que tratam o homem como objeto a ser massificado. A maioria dos profetas da revolução total é composta por artistas(...).
Arte revolucionária foi a palavra de ordem no Terceiro Mundo nos anos 60 e continuará a ser nesta década. Acho, porém, que a mudança de muitas condições políticas e mentais exige um desenvolvimento contínuo dos conceitos de arte revolucionária.
Primarismo muitas vezes se confunde com os manifestos ideológicos. O pior inimigo da arte revolucionária é sua mediocridade. Diante da evolução sutil dos conceitos reformistas da ideologia imperialista, o artista deve oferecer respostas revolucionárias capazes de não aceitar, em nenhuma hipótese, as evasivas propostas. E, o que é mais difícil, exige uma precisa identificação do que é arte revolucionária útil ao ativismo político, do que é arte revolucionária lançada na abertura de novas discussões do que é arte revolucionária rejeitada pela esquerda e instrumentalizada pela direita(...).
(...)Uma obra de arte revolucionária deveria não só atuar de modo imediatamente político como também promover a especulação filosófica, criando uma estética do eterno movimento humano rumo à sua integração cósmica.
A existência descontínua desta arte revolucionária no Terceiro Mundo se deve fundamentalmente às repressões do racionalismo.
Os sistemas culturais atuantes, de direita e de esquerda, estão presos a uma razão conservadora. O fracasso das esquerdas no Brasil é resultado deste vício colonizador. A direita pensa segundo a razão da ordem e do desenvolvimento (...). As respostas da esquerda, exemplifico outra vez no Brasil, foram paternalistas em relação ao tema central dos conflitos políticos: as massas pobres.
O Povo é o mito da burguesia.
A razão do povo se converte na razão da burguesia sobre o povo.
(...)A razão de esquerda revela herdeiro da razão revolucionária burguesa européia. A colonização, em tal nível, impossibilita uma ideologia revolucionária integral que teria na arte sua expressão maior, porque somente a arte pode se aproximar do homem na profundidade que o sonho desta compreensão possa permitir.
A ruptura com os racionalismos colonizadores é a única saída.
(...)A revolução é a anti-razão que comunica as tensões e rebeliões do mais irracional de todos os fenômenos que é a pobreza.
Nenhuma estatística pode informar a dimensão da pobreza.
A pobreza é a carga autodestrutiva máxima de cada homem e repercute psiquicamente de tal forma que este pobre se converte num animal de duas cabeças: uma é fatalista e submissa à razão que o explora como escravo. A outra, na medida em que o pobre não pode explicar o absurdo de sua própria pobreza, é naturalmente mística.
A razão dominadora classifica o misticismo de irracionalista e o reprime à bala. Para ela tudo que é irracional deve ser destruído, seja a mística religiosa, seja a mística política. A revolução, como possessão do homem que lança sua vida rumo à idéia, é o mais alto astral do misticismo. As revoluções fracassam quando esta possessão não é total (...),quando, ainda acionado pela razão burguesa, método e ideologia se confundem a tal ponto que paralisam as transações da luta.
Na medida em que a desrazão planeja as revoluções a razão planeja a repressão. (...)
Há que tocar, pela comunhão, o ponto vital da pobreza que é seu misticismo. Este misticismo é a única linguagem que transcende ao esquema irracional da opressão. A revolução é uma mágica porque é o imprevisto dentro da razão dominadora. No máximo é vista como uma possibilidade compreensível(...).
O irracionalismo liberador é a mais forte arma do revolucionário. E a liberação, mesmo nos encontros da violência provocada pelo sistema, significa sempre negar a violência em nome de uma comunidade fundada pelo sentido do amor ilimitado entre os homens. Este amor nada tem a ver com o humanismo tradicional, símbolo da boa consciência dominadora.
As raízes índias e negras do povo latino-americano devem ser compreendidas como única força desenvolvida deste continente. Nossas classes médias e burguesias são caricaturas decadentes das sociedades colonizadoras.
A cultura popular não é o que se chama tecnicamente de folclore, mas a linguagem popular de permanente rebelião histórica.
O encontro dos revolucionários desligados da razão burguesa com as estruturas mais significativas desta cultura popular será a primeira configuração de um novo significado revolucionário.
O sonho é o único direito que não se pode proibir.
(...)Hoje recuso falar em qualquer estética. A plena vivência não pode se sujeitar a conceitos filosóficos. Arte revolucionária deve ser uma mágica capaz de enfeitiçar o homem a tal ponto que ele não mais suporte viver nesta realidade absurda.
Borges, superando esta realidade, escreveu as mais liberadoras irrealidades de nosso tempo. Sua estética é a do sonho. Para mim é uma iluminação espiritual que contribuiu para dilatar a minha sensibilidade afro-índia na direção dos mitos originais da minha raça. Esta raça, pobre e aparentemente sem destino, elabora na mística seu momento de liberdade. Os Deuses Afro-índios negarão a mística colonizadora do catolicismo, que é feitiçaria da repressão e da redenção moral dos ricos.
Não justifico nem explico meu sonho porque ele nasce de uma intimidade cada vez maior com o tema dos meus filmes, sentido natural de minha vida.

Glauber Rocha
Columbia University – New York
Janeiro de 1971

Ensaio de Tomás Gutierrez Alea


O ESPECTADOR CONTEMPLATIVO E O ESPECTADOR ATIVO

O espetáculo é essencialmente um fenômeno destinado à contemplação.
O homem, reduzido momentaneamente à condição de espectador, contempla um fenômeno peculiar cujos traços característicos apontam para o insólito, o extraordinário, o excepcional, o fora do comum.
É certo que também alguns fenômenos da realidade – fenômenos naturais ou sociais – podem se manifestar espetaculosamente: guerras, demonstrações de massa, forças desencadeadas pela natureza, paisagens grandiosas...Constituem um espetáculo na medida em que rompem com a imagem habitual que se tem da realidade. Oferecem uma imagem não familiar, magnificada, reveladora, ao homem que os contempla: o espectador. (...)Mas, em todo caso, o espetáculo existe como tal em função do espectador; este é, por definição, um ser que contempla e sua condição está determinada não somente pelas características próprias do fenômeno mas pela posição que o indivíduo (sujeito) ocupa em relação ao mesmo. Pode-se ser ator ou espectador diante do mesmo fenômeno,
Isso quer dizer que o espectador é um ser passivo?
(...)Poderíamos dizer então que a condição do espectador como momento no processo de apropriação ou interiorização pelo sujeito da realidade – que inclui, claro, a esfera da cultura, produto da própria atividade humana -, é fundamental. (...)
Assim, quando falamos de espectador “contemplativo” referimo-nos àquele que não supera o nível passivo-contemplativo; enquanto o espectador “ativo” seria aquele que, tomando como ponto de partida o momento da contemplação viva, gera um processo de compreensão crítica da realidade (que inclui, claro, o espetáculo), e, conseqüentemente, uma ação prática transformadora.
O espectador que contempla um espetáculo está diante do produto de um processo criativo de uma imagem fictícia que teve seu ponto de partida também num ato de contemplação viva da realidade objetiva por parte do artista. (...)Também o espectador pode se remeter ao conteúdo mais ou menos objetivo que o espetáculo reflete, que funciona então como uma mediação no processo de compreensão da realidade.
Quando a relação se produz só no primeiro nível, isto é, quando o espetáculo é contemplado como um objeto em si e nada mais, o espectador “contemplativo” pode satisfazer uma necessidade de desfrute, de gozo estético, mas sua atividade, expressa fundamentalmente numa aceitação ou rejeição do espetáculo, não supera o plano cultural. Este se oferece, então, como simples objeto de consumo. (...)
Na sociedade capitalista o típico espetáculo cinematográfico de consumo é constituído pela comédia ligeira ou o melodrama cujo final invariável, o happy end, foi – e continua sendo em alguma medida – uma arma ideológica de certa eficácia para alentar e consolidar o conformismo em grandes setores do povo. (...)
O espetáculo como refúgio diante de uma realidade hostil só pode colaborar com todos os fatores que mantêm essa realidade na medida em que atua como pacificador, como válvula de escape, e condiciona um espectador contemplativo diante da realidade. O mecanismo é demasiado óbvio e transparente e foi denunciado com muita freqüência . (...)
O descrédito do happy end em meio a uma realidade cuja simples aparência desmentia violentamente a imagem cor-de-rosa que se queria vender fez com que se recorresse a outros mecanismos mais sofisticados. O mais espetacular, sem dúvida, foi o happening, que leva o jogo com o espectador a um plano supostamente corrosivo para uma sociedade alienante e repressiva. Não somente se propõe dar ao espectador a oportunidade de participar, como o arrasta ainda contra sua vontade e o envolve em ações “provocadoras” e “subversivas”, mas tudo isso, claro, dentro do espetáculo, onde qualquer coisa pode acontecer, onde muitas coisas – até mulheres, em casos extremos – podem ser violadas, e onde se introduz o insólito, o inesperado, a surpresa, o exibicionismo... (...).
No espetáculo cinematográfico, claro, este tipo de recurso para facilitar ou provocar a “participação” do espectador sobre bases de aleatoriedade, não tem lugar. E, no entanto, o problema da participação do espectador continua de pé e reclama uma solução também dentro – ou melhor, a partir – do espetáculo cinematográfico, o que põe a nu o enfoque simplista com que muitas vezes foi abordado este problema. A primeira coisa que nos revela esta inquietude é algo que freqüentemente é esquecido e que, no entanto, tem o caráter de verdade axiomática: a resposta do espectador que interessa não é somente a que pode dar dentro do espetáculo, mas a que deve dar diante da realidade. Isto é, o que interessa fundamentalmente é a participação real, não a participação ilusória.
Quando se atravessam períodos de relativa estabilidade numa sociedade dividida em classes, a participação social do indivíduo é mínima. De uma forma ou de outra, seja pela coação física, moral ou ideológica, o indivíduo é manipulado como um objeto a mais e sua atividade só tem lugar nos marcos da produção direta de bens materiais que, na sua maior parte, vão servir para satisfazer as necessidades da classe exploradora. (...)É sobretudo nessas circunstâncias, sem dúvida, que se revelam com todo seu peso as palavras de Aimé Cesaire quando nos fala da “atitude estéril do espectador”. Isto é, a realidade exige que se tome posição diante dela, e essa exigência está na base da relação do homem com o mundo em todo momento, em todo transcurso da história. (...)Trata-se então é de estimular e encaminhar a ação do espectador no sentido em que se move a história, pelo caminho do desenvolvimento da sociedade.
Para provocar essa resposta no espectador é preciso, como condição primeira, que no espetáculo se questione a realidade, se exprimam e se transmitam inquietações, se façam interrogações. Isto é, é preciso um espetáculo “aberto”.
Mas o conceito de “abertura” é demasiado amplo, situa-se em todos os níveis operacionais da obra artística e por si mesmo não garante uma participação conseqüente no espectador. Quando se trata de um espetáculo aberto, que coloca inquietações não somente estéticas – como fonte de gozo ativo – mas conceituais e ideológicas, o espetáculo se converte (sem deixar de ser um jogo no sentido em que o é todo espetáculo) numa operação séria porque incide no plano da realidade mais profunda.
No entanto, para conseguir o máximo de eficácia e funcionalidade, não basta que se trate de uma obra aberta – no sentido de indeterminada. É necessário que a própria obra seja portadora daquelas premissas que possam levar o espectador a uma determinação da realidade, isto é, que o lance pelo caminha da verdade em direção ao que se pode chamar uma tomada de consciência dialética sobre a realidade. Pode operar então como um verdadeiro “guia para a ação”. É preciso não confundir abertura com ambigüidade, inconsistência, ecletismo, arbitrariedade...
E em que se apóia o artista para conceber um espetáculo que não somente proponha problemas,mas que assinale ao espectador a via que deve percorrer para descobrir por si mesmo um nível mais alto de determinação? Aqui, inegavelmente, a arte deve fazer uso do instrumental desenvolvido ela ciência na tarefa investigadora e aplicar todos os recursos metodológicos que estão a seu alcance e que a teoria da informação, a lingüística, a psicologia, a sociologia, etc. lhe podem proporcionar. O espetáculo, enquanto se converte no pólo negativo da relação realidade-ficção, deve desenvolver uma estratégia adequada a cada circunstância e não devemos esquecer que, na prática, o espectador não pode ser considerado como uma abstração, mas está condicionado histórica e socialmente de tal forma que o espetáculo deve dirigir-se – em primeira instância – a um espetáculo concreto, diante do qual pode desenvolver ao máximo sua potencialidade operativa.

In: ALEA, Tomás Gutiérrez. Dialética do Espectador. São Paulo: Summus Editorial, 1983.

Estética da Fome - Manifesto de Glauber Rocha


EZTETYKA DA FOME 65


(..) Enquanto a América Latina lamenta suas misérias gerais,o interlocutor estrangeiro cultiva o sabor dessa miséria, não como sintoma trágico, mas apenas como dado formal em seu campo de interesse. Nem o latino comunica sua verdadeira miséria ao homem civilizado nem o homem civilizado compreende verdadeiramente a miséria do latino. (..)
Para o observador europeu, os processos de produção artística do mundo subdesenvolvido só o interessam na medida que satisfazem sua nostalgia do primitivismo; e se primitivismo se apresenta híbrido, disfarçado sob tardias heranças do mundo civilizado, mal compreendidas porque impostas pelo condicionamento colonialista.
A América Latina permanece colônia e o que diferencia o colonialismo de ontem do atual é apenas a forma mais aprimorada do colonizador: e além dos colonizadores de fato, as formas sutis daqueles que também sobre nós armam futuros botes. (...)
Este condicionamento econômico e político nos levou ao raquitismo filosófico e à impotência, que, às vezes inconsciente, às vezes não, geram no primeiro caso a esterilidade e no segundo a histeria.
A esterilidade: aquelas obras encontradas fartamente em nossas artes, onde o autor se castra em exercícios formais que, todavia, não atingem a plena possessão de suas formas. O sonho frustrado da universalização: artistas que não despertam do ideal estético adolescente. (...)
A histeria: um capítulo mais complexo. A indignação social provoca discursos flamejantes. O primeiro sintoma é o anarquismo que marca a poesia jovem até hoje (e a pintura). O segundo é uma redução política da arte que faz má política por excesso de sectarismo. O terceiro, e mais eficaz, é a procura de uma sistematização para a arte popular. (..) Mais uma vez o paternalismo é o método de compreensão para uma linguagem de lágrimas ou de mudo sofrimento.
A fome latina, por isso, não é somente um sintoma alarmante: é o nervo de sua própria sociedade. Aí reside a trágica originalidade do cinema novo diante do cinema mundial: nossa originalidade é nossa fome e nossa maior miséria é que esta fome, sendo sentida, não é compreendida.
De Aruanda a Vidas secas, o cinema novo narrou, descreveu, poetizou, discursou, analisou, excitou os temas da fome: personagens comendo terra, personagens comendo raízes, personagens roubando para comer, personagens matando para comer, personagens sujas, feias, descarnadas, morando em casas sujas, feias, escuras; foi esta galeria de famintos que identificou o cinema novo com o miserabilismo tão condenado pelo Governo, pela crítica a serviço dos interesses antinacionais, pelos produtores e pelo público – este último não suportando as imagens da própria miséria. (...)Estes são os filmes que se opõem à fome, como se, na estufa e nos apartamentos de luxo, os cineastas pudessem esconder a miséria moral de uma burguesia indefinida e frágil ou se mesmo os próprios materiais técnicos e cenográficos pudessem esconder a fome que está enraizada na própria incivilização. (..)
Nós compreendemos esta fome que o europeu e o brasileiro na maioria não entende. Para o europeu é um estranho surrealismo tropical. Para o brasileiro é uma vergonha nacional. Ele não come mas tem vergonha de dizer isto; e, sobretudo, não sabe de onde vem esta fome. Sabemos nós – que fizemos filmes feios e tristes, estes filmes gritados e desesperados onde nem sempre a razão falou mais alto – que a fome não será curada pelos planejamentos de gabinete(..). Assim, somente uma cultura da fome, mirando suas próprias estruturas, pode superar-se qualitativamente: e a mais nobre manifestação cultural da fome é a violência. (..)
Pelo cinema novo: o comportamento exato de um faminto é a violência, e a violência de um faminto não é primitivismo. Fabiano é primitivo? Antão é primitivo? Corisco é primitivo? A mulher de Porto das caixas é primitiva?
Do cinema novo: uma estética da violência antes de ser primitiva é revolucionária, eis aí o ponto inicial para que o colonizador compreenda a existência do colonizado; somente conscientizando sua possibilidade única, a violência, o colonizador pode compreender, pelo horror, a força da cultura que ele explora. Enquanto não ergue as armas o colonizado é um escravo: foi preciso um primeiro policial morto para que o francês percebesse um argelino.
De uma moral: essa violência, contudo, não está incorporada ao ódio, como também não diríamos que está ligada ao velho humanismo colonizador. O amor que esta violência encerra é tão brutal quanto a própria violência, porque não é um amor de complacência ou de contemplação mas de um amor de ação e transformação.(...)
Já passou o tempo em que o cinema novo precisava explicar-se para existir: o cinema novo necessita processar-se para que se explique à medida que nossa realidade seja mais discernível à luz de pensamentos que não estejam debilitados ou delirantes pela fome. O cinema novo não pode desenvolver-se efetivamente enquanto permanecer marginal ao processo econômico e cultural do continente latino-americano; além do mais, porque o cinema novo é um fenômeno dos povos colonizados e não uma entidade privilegiada do Brasil: onde houver um cineasta disposto a filmar a verdade e a enfrentar os padrões hipócritas e policialesco da censura, aí haverá um germe vivo do cinema novo. Onde houver um cineasta disposto a enfrentar o comercialismo, a exploração, a pornografia, o tecnicismo, aí haverá um germe do cinema novo. Onde houver um cineasta, de qualquer idade ou de qualquer procedência, pronto a pôr seu cinema e sua profissão a serviço das causas importantes de seu tempo, aí haverá um germe do cinema novo. A definição é esta e por esta definição o cinema novo se marginaliza da indústria porque o compromisso do cinema industrial é com a mentira e com a exploração. A integração econômica e industrial do cinema novo depende da liberdade da América Latina. (...)
Não temos por isso maiores pontos de contato com o cinema mundial.
O cinema novo é um projeto que se realiza na política da fome, e sofre, por isto mesmo, todas as fraquezas conseqüentes de sua existência.

Glauber Rocha.

Memórias, Imagens e Subdesenvolvimentos

Toda memória reivindica imagens. Seja como ícones, ou como outros símbolos visuais, as imagens - quando fortes - tornam-se traumáticas, fetiches, opacas, transparentes. Toda memória, quando eivada por lapsos, lacunas e esquecimentos, inocula uma busca paranóica pela imagem-síntese, a ‘imagem-tempo’.

É nesse contexto que as memórias dos acontecimentos históricos dos países subdesenvolvidos tornam-se singulares, pois são marcadas por cisões. Não há um traço linear, tampouco coerente; mas ciclos. Uma intermitência totalmente acoplada às características industriais de países onde o subdesenvolvimento não é uma etapa, um estágio, mas um estado (...). O cinema é incapaz de encontrar dentro de si energias que lhe permitem escapar à condenação do subdesenvolvimento . Cinema e subdesenvolvimento tramitariam num círculo vicioso. Um círculo onde o olvido e a lembrança, numa provável dialética com as imagens, pairam à mercê dessas inconstâncias.
Ao reunirmos filmes das décadas de sessenta e setenta de Glauber Rocha, Fernando Birri, Fernando Solanas, Octavio Getino, Patrício Guzmán, Miguel Littin, Tomás Gutiérrez Alea, Raymundo Gleyzer, Joaquim Pedro de Andrade, Eduardo Cotinho e Vladimir Carvalho, propomos um exercício de imaginação e reconstrução histórica. Compartilhamos memórias. Fragmentos e cacos de revoluções, revoltas, experimentos estéticos e posicionamentos políticos que inseriram a América Latina no cerne do debate mundial. Memórias que foram relegadas ao porão da história.
O recorte histórico que oferecemos é rico (e sofrido). Os golpes militares no Brasil e na Argentina eram apenas arrefecidos pela vibração que vinha da revolução cubana. Em seguida, a queda de Allende – outro golpe violento e simbólico, retratado com força em A Batalha do Chile, de Patrício Guzmán – é mais uma rasteira à autonomia dos potenciais culturais e políticos da América Latina.
Embora não sejam estritamente documentais, os filmes que selecionamos traçam um diálogo direto com esta conjuntura política. O teor histórico que resguardam é duplo: não documentam apenas aquele momento em que jorravam contradições e paradoxos das veias da América Latina; são intervenções, buscas por outras diretrizes históricas, alternativas àquelas impostas pelas ditaduras e pelo famoso bloqueio econômico.
A linha política que une a obra dos diretores mencionados não se restringe aos ideais socialistas, comunistas ou ‘revolucionários’ que singularizaram aquelas décadas. Essas ideologias são acompanhadas por uma atenção às expressões populares, à luta contra correntes hegemônicas e contra qualquer ameaça à soberania nacional. A América Latina é desnudada nos seus esplendores culturais; é engolida a palo seco frente às mazelas impelidas por séculos de colonização.
Há uma linha estética que também tece um parentesco entre estas películas latino-americanas. Na história do cinema ‘oficial’, narrada pelos centros hegemônicos de estudos de audiovisual, esses filmes não passam de herdeiros do neo-realismo italiano e da nouvelle vague francesa. São obras, no entanto, que apresentam algumas novidades relevantes e que demandam outros paradigmas interpretativos. Assim é o caso da realização conjunta dos filmes com índios quéchua encabeçada pelo grupo Ukamau, na Bolívia - uma novidade ímpar pelo ato de compartilhar a criação cinematográfica; a ampla utilização de alegorias como uma proposta de construção dramatúrgica; a busca de uma nova relação com o espectador, que se denominou de dialética e na América Latina ganhou matizes diferentes das preconizadas por Bertolt Brecht; uma compreensão política da história e que é uma característica peculiar destes cineastas e da sua geração. Essa novidade estética fica cristalina nos manifestos e ensaios por eles produzidos, dos quais trechos são publicados nesse catálogo.
Tais textos realçam as singularidades do fazer cinema na América Latina. A opção pela agressividade. A politização e a exploração estética das expressões populares, da religiosidade, dos conhecimentos tradicionais. A verve que recusa os modelos de roteiro, de decupagem e de personagem dos cinemas hegemônicos. A via do experimentalismo. Uma renovação de conceitos como classe, massa e povo, conceitos que passam à margem das especulações da nouvelle vague.
Estes cineastas assumiram o subdesenvolvimento como um ponto de partida para suas criações. Ele era lido como uma condição política. O termo subdesenvolvimento, aliás, tornou-se obsoleto. A globalização e o mundo contemporâneo passam uma mensagem, um simulacro, de convívio equilibrado entre países ricos, emergentes e pobres. Pouco importa o termo: seja ele ‘terceiro mundo’, ‘países em desenvolvimento’ ou ‘emergentes’, o contexto político e econômico que esses diretores perceberam e cantaram continua atual. E é por isso que optamos por manter o termo subdesenvolvimento: por desconstruir a falácia da inclusão preconizada pelos discursos da globalização.
A dificuldade que tivemos para localizar boa parte dos filmes que apresentamos é a principal prova da precariedade em que se encontra a memória audiovisual e cinematográfica da América Latina. Trabalhamos como arqueólogos para desvendarmos obras importantes, imprescindíveis, e que possuem, incrivelmente, menos de cinqüenta anos. Alguns dos filmes inicialmente planejados sequer puderam ser encontrados em Dvd, como Ukamau e Yawar Malku de Jorge Sanjinés. Cabe citar que muitos deles foram proibidos e/ou censurados por ditaduras (como La Hora de los Hornos e O País de São Saruê) - em alguns casos, tentaram apreendê-los e até queimá-los. A maioria dessas cópias, infelizmente, continua embalada por uma grossa camada de acetato e corre o constante perigo do desaparecimento.
Essas memórias do subdesenvolvimento não são desejadas. Elas persistem por pura teimosia. A melhor imagem que possa sintetizar essa sensação seja, talvez, a do fotógrafo Jorge Müler Silva, de A Batalha do Chile, a quem o filme é dedicado. Ao filmar a primeira tentativa de golpe no Chile, alguns meses antes da ascensão de Pinochet, sua câmera se fixou num policial enquanto este apontava a arma em sua direção: o cinegrafista não poderia estar ali; aquela cena não poderia ser filmada. Vem o disparo: a câmera treme. A câmera cai. A imagem é interrompida. Seu registro silenciado.
Jorge Müler Silva morre do mesmo modo que milhares de civis da América Latina (e por motivos semelhantes). Morre como os desaparecidos políticos, como muitos exilados. As ditaduras que marcaram por duas décadas este continente semearam o esquecimento e o silêncio. É hora de reivindicarmos o direito de interagirmos com essas memórias. De aprendermos com essas imagens. De debatermos nossos subdesenvolvimentos.

Pablo Gonçalo
(Curador)